Brazilian storm brilha, mas Rio segue sem representantes no WCT

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Lucas Silveira em Teahupoo, no Taiti | Divulgação/Henrique Pinguim

Gabriel Medina é de Maresias, assim como Miguel Pupo. O atual campeão mundial Adriano de Souza, apesar do apelido de ‘Mineirinho’, é do Guarujá, mesma praia onde mora Caio Ibelli. Filipe Toledo e Wiggolly Dantas são de Ubatuba. Alex Ribeiro é de Praia Grande. Dos 10 brasileiros que disputarão o WCT de 2016, sete são paulistas. Os potiguares Jadson André e Italo Ferreira e o argentino radicado catarinense Alejo Muniz completam a lista. E os cariocas, onde estão? Pelo segundo ano seguido nenhum surfista do Rio estará na elite. Enquanto a ‘brazilian storm’ está ainda mais forte nesta temporada, o surfe do Rio de Janeiro parece viver de brisa. Nem um ventinho tem batido ultimamente.

Além de não ter nenhum representante no WCT, os surfistas do Rio mal fizeram cócegas no WQS, a divisão de acesso, onde os jovens talentos batalham para ficar entre os dez primeiros que garantem uma vaga na elite. Neste ranking, o melhor carioca foi Lucas Silveira, numa distante, e bota distante nisso, 104ª posição. No circuito brasileiro, o veterano Léo Neves foi o melhor representante do Rio, na 10ª colocação. Depois dele, Lucas Silveira foi o próximo na lista, em 37º. Desde 2008, com Gustavo Fernandes, um carioca não é campeão nacional.

Entressafra de talentos? Falta de eventos e de investimento? Atletas e dirigentes apontam um pouco de tudo para tentar explicar porque o berço do surfe no Brasil e palco da etapa nacional no circuito mundial passa por esse momento de vacas magras enquanto o esporte alcança resultados históricos no WCT.

– Não há um fator isolado que justifique isso. O Rio tem um circuito sub-14, mas não tem um circuito profissional há dois anos. Enquanto em São Paulo a maioria das cidades tem circuitos municipais de base, aqui as associações locais não têm feito campeonatos. Para gerar o surfista, tem que ter um circuito para ele se apresentar. Não há uma rotina de eventos, o surfista não tem um objetivo e o garoto acaba ficando sem um profissional para ter como ídolo – diz o carioca Pedro Falcão, diretor executivo da Associação Brasileira de Surfe Profissional (Abrasp).

Pedro aponta ainda a falta de uma empresa forte de artigos de surfe no Rio, e a consequente falta de patrocínio para os profissionais cariocas, como um fator que desestimula o surgimento de novos talentos.

– Em Saquarema, por exemplo, profissionais consagrados como o Raoni Monteiro e o Léo Neves não têm patrocínio. A garotada vê isso e não tem um estímulo. Para ser patrocinado por uma mariola e não ter campeonato para disputar, o cara acaba desistindo de ser competidor.

Do alto da experiência de seus 44 anos e com 13 temporadas no WCT, Victor Ribas lembra com carinho dos seus tempos de surfista iniciante no Rio.

– Na minha época de amador às vezes rolavam dois ou três eventos no mesmo fim de semana. Dava para escolher onde competir! Hoje falta apoio para atletas e eventos. As empresas preferem apoiar um freesurfer, pois esses acabam dando mais retorno na mídia.

Presidente da Federação de Surfe do Estado do Rio de Janeiro (Feserj), Abílio Fernandes diz que o trabalho com a nova geração tem sido feito, mas reconhece que os profissionais têm sofrido com a falta de investimento.

– A categoria de base no Rio vai muito bem, obrigado. Temos um circuito sub-14 muito forte, com categorias até para surfistas de menos de oito anos. Aos poucos está começando a surgir uma nova geração, mas isso não se colhe de um dia para o outro. Estamos tentando preparar os garotos para corrigir esse hiato. Depois de Léo Neves e Raoni (últimos cariocas a disputar o WCT), o Rio não teve uma safra boa de atletas. Hoje em dia temos o Lucas Silveira, que já foi campeão brasileiro mirim. Mesmo com o surfe crescendo, ainda há falta de interesse dos patrocinadores para investir no circuito profissional, mas estamos confiantes para tentar viabilizar eventos neste ano – aposta Abílio.

O presidente da Feserj cobra ainda um maior investimento da Prefeitura do Rio no esporte.

– A prefeitura sempre nos apoiou, mas a verba poderia ser distribuída de uma maneira mais justa. Atualmente ela investe R$ 5 milhões para fazer a etapa do WCT. Se dessem 10% disso para a Feserj, fazíamos barba, cabelo e bigode. Seria possível realizar os três circuitos que pretendemos – o sub-14, o pós-14 e o profissional. Mas também não podemos ficar dependentes do governo. Temos que procurar a iniciativa privada e estamos fazendo isso.

No calendário provisório divulgado na semana passada, a Feserj prevê a disputa de um circuito profissional com três etapas, em Macaé, Búzios e Rio. Os circuitos sub-14 e pós-14 também teriam três etapas.

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Pedro Neves entubando no Recreio | Divulgação

Apontado como um dos novos talentos, Lucas Silveira, 19 anos, credita até mesmo a características da cidade e do carioca a dificuldade atual do surfe do Rio.

– O estilo de vida é muito diferente dos outros lugares do Brasil. O Rio é uma cidade grande, o tempo passa mais rápido. Enquanto em lugares menores você surfa três vezes por dia e treina duas, no Rio você está preso no trânsito indo da praia para a academia. E o carioca tem um estilo natural de querer curtir também. Com a profissionalização do surfe, temos que abrir mão de várias coisas, e às vezes estando no Rio, com tanta coisa acontecendo, pode ser difícil conciliar – diz Lucas, atualmente morando em Florianópolis. – Mas acredito que é uma fase. Temos alguns ‘moleques’ novos que estão surfando muito bem – completou.

Em 2015, o circuito sub-14 teve três etapas, no Arpoador, Barra e Recreio, nas categorias Pré-Petit, Petit, Infantil, Iniciante e Iniciante Feminino. No Pós-14, foram outras três etapas, nas categorias Mirim, Surdos, Júnior e Júnior Feminino. Houve ainda um evento Pro-Júnior, na Prainha, que consagrou Pedro Neves como campeão. Em 2016, o jovem de 19 anos pretende disputar o WQS e sonha com a realização de um circuito profissional nas praias do Rio.

– O último campeonato profissional que disputei no Rio foi em 2013. O surfe carioca parece um pouco esquecido, mas tem uma geração muito boa vindo aí, como o Matheus Faria, o Theo Fresia (campeão estadual júnior). Precisamos de apoio.

POR RENATO DE ALEXANDRINO
12/01/2016 06:00